quarta-feira, 27 de dezembro de 2023

"Tejo"


 
Tejo

É um lento e majestoso
Caudal de claridade
Que corre no teu leito,
Rio perfeito
Como o dia a passar,
Largo, sereno, aberto. 
Logo à partida, certo
De chegar...


[Miguel Torga, in "Diário XI"]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


domingo, 24 de dezembro de 2023

"É Quase Natal"



É quase Natal

É quase Natal
e ali vai o pescador,
o velho do bigode 
e da camisa de flanela
com quadrados verdes.

Não sei o que é que ele vê
e encontra no Tejo.
Não acredito que queira
pescar um peixe
para a consoada.
Talvez queira apenas
estar só e abraçar
os seus fantasmas queridos
sem qualquer objecção.

É quase Natal
e ali vai o pescador,
com a cana ao ombro
como se fosse um dia
igual aos outros.

João Almeida


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)

sábado, 23 de dezembro de 2023

"Não me fales do Natal"



Não me fales do Natal

Não me fales do Natal.
Não é coisa que recorde
com alegria e saudade.
Pode parecer-te mal
mas falta-lhe verdade.

A verdade que encontramos
nas coisas simples da vida.
O mundo não é só um dia
quando amamos, amamos,
não se trata de uma fantasia.

Se olhares para  o rio
este Tejo de beleza única
 que diz sempre presente,
esqueces o falso e o vazio
 que cada um sente

É por isso que te peço,
e que não te pareça mal
fala-me de outras coisas
boas que nunca esqueço,
mas não me fales do Natal.

Zé Gê Éfe

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)

quinta-feira, 30 de novembro de 2023

"Menina dos Olhos de Água"


Menina dos Olhos de Água


Menina, em teu peito sinto o Tejo
e vontades marinheiras de aproar.
Menina, em teus lábios sinto fontes
de água doce que corre sem parar.


Menina, em teus olhos vejo espelhos
e em teus cabelos nuvens de encantar
e em teu corpo inteiro sinto o feno
rijo e tenro que nem sei explicar.

Se houver alguém que não goste
não gaste - deixe ficar
que eu só por mim quero-te tanto
que não vai haver menina p'ra sobrar.

Aprendi nos "esteiros" com Soeiro
aprendi na "Fanga" com Redol.
Tenho um rio grande o mundo inteiro
e sinto o mundo inteiro no teu colo.

Aprendi a amar a madrugada
que desponta em mim quando sorris.
És um rio cheio de água levada
e dás rumo à fragata que escolhi.

Se houver alguém que não goste
não gaste - deixe ficar ...
que eu só por mim quero-te tanto
que não vai haver menina p'ra sobrar.


[Pedro Barroso, in álbum "Cantos da Borda d'água"]


(Fotografia de Luís Eme - Almada)

sábado, 25 de novembro de 2023

Conversa Com Fernando Pessoa no Martinho

 


Conversa Com Fernando Pessoa no Martinho
 
 
A casa continua como quando aqui paravas.
Talvez sejam os mesmos que agora a povoam
destas conversas sonolentas e cruzadas.
Ali ao longe o rio persiste em navegar
e só as águas envelheceram. O resto é
a cidade quer dizer o nevoeiro
que quando desembarcaste. Fala-se na esperança
e acredita-se no medo. O resto é a cidade
que cantaste e te desconheceu
e ainda desconhece os que procuram
o violino de palavras que criaste.
 
 
Manuel Alberto Valente


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, 20 de outubro de 2023

"Às vezes, ao fim da tarde..."


[...] «Às vezes, ao fim da tarde, descíamos a Avenida, depois a Baixa, íamos até ao rio. Nos dias de sol havia sempre junto da amurada crianças que olhavam deslumbradas para os barcos ou que corriam alegremente atrás das pombas.» [...]


[Maria Judite de Carvalho, in "tanta gente Mariana..."]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, 17 de outubro de 2023

"Cais de Lisboa"

                                 

                              Cais de Lisboa


Colunas de séculos passados
Onde o tempo não perdoa
São dois mastros apontados
Ao céu da Nossa Lisboa

Foste cais da realeza
Admirado, ainda és
Até a coroa inglesa
Ancorou a vossos pés

Nesses tempos da lonjura
Caravelas a partir
Homens bravos à procura
Dum mundo por descobrir

Gaivotas em movimento
No cais de tanta saudade
São como notas ao vento
Chilreando Liberdade

A nossa ponte imponente
De Abril só há gemidos
Mas o Tejo comovente
Amena os cravos esquecidos

Onde estão os cacilheiros
Que a câmara não captou?
Mais os velhos marinheiros
Que o pai Tejo adoptou?

Estas águas que nos levam
E nos corta a respiração
É o rio onde navegam
As mágoas que vão pró mar.

Luís Alves

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

"Esta luta que se chama vida"

 


"Esta luta que se chama vida"

Maldito o rio: não é água mas suor.
Os dias passam e é sempre a mesma lida.
Mas um que luta é cada vez maior.
Bendita esta luta que se chama vida.

Muito cavalga o alvo e verde casario
Para aprender do rio e da serenidade.
Aquela espuma branca em que um barco o abriu
É um colar que põe no peito da cidade.

Dó eles suam mas só eles sabem
O preço de estar vivo sobre a terra.
Só nestas mãos enormes é que cabem
As coisas mais reais que a vida encerra.

Ruy Belo

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Perder-me neste "muito Tejo"


Não sei se são tontos.
Não me interessa saber.
Olho para eles como olho para os pombos.
Sim, quando estão parados
no chão não lhes ligo,
só lhes presto atenção
quando começam a voar...

Por isso podem continuar a falar,
é como se fosse japonês.
Sim, é mais música estranha
que palavras nos meus ouvidos.

Prefiro perder-me neste
"muito Tejo"
que hoje ainda é maior.
Quase que invade as margens...

(poema da Bela)


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

"Quinta da Alegria"


«No início do Verão de 1987 vim viver para Cacilhas - devo esclarecer desde já algumas mentes perversas, que atravessei o rio Tejo de cacilheiro, e que não caí de para-quedas como insinuam - livre e solto de qualquer raiz familiar. Como não encontro nenhuma razão especial para explicar o porquê desta opção, quase que me apetece dizer que vim morar para Almada porque sim.

Claro que a possibilidade de reencontrar o Tejo pesou muito nesta escolha. Nunca esqueci a janela da marquise da casa do Zé e da Elisete, na Cruz Quebrada, onde assisti muitas vezes ao último mergulho do Sol nas águas do Atlântico, e à transformação do Rio num imenso Oceano...»

[Luís Alves Milheiro, in "Geografias da Margem Sul"]


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sábado, 19 de agosto de 2023

O Recorte do Tejo...


«Subimos ao piso superior para ver as quatro máquinas desenhadas e construídas nas oficinas do fabricante inglês E. Windsor e Filhos, que representava a melhor engenharia de então. Funcionaram até 1928. Atravessamos a sala de soalho de madeira, olhando o recorte do Tejo que preenche a grande janela virada a sul, oferendo a sua visão de espelho de água, neste dia de luz clara. Depois desse longínquo dia de inauguração da Estação dos Barbadinhos e de muitos acrescentos e melhorias no sistema de distribuição, foram precisas mais de sete décadas para a água do Tejo entrar finalmente na urbe.»

[Ana Soromenho, "Expresso", 18 de Agosto de 2023]


(Fotografia de Luis Eme - Lisboa)


segunda-feira, 31 de julho de 2023

"Este Rio" (o outro...)


«Recordo aquele rio que os parisienses enfeitam com barracas de velhas gravuras e livros em segunda mão, com tranquilos e esperançosos pescadores à linha, com estudantes, com namorados, com simples adoradores do Sol. E vejo este rio tão deserto. Porque é uma estranha cidade, esta que não o merece. Um rio tão belo como poucas cidades podem gabar-se de possuir. Lisboa, no entanto voltou-lhe as costas e transformou-o em objecto de luxo para ver ao longe. Uma espécie de quadro na parede. E anunciam-se no jornal casas, geralmente muitas casas, com vista para o rio. Com vista, é tudo.»

[parte inicial de uma das memoráveis crónicas de Maria Judite de Carvalho, imortalizadas no livro, "Este Tempo", datada de Dezembro de 1974]

Nota: Como disse noutra transcrição das palavras da Maria Judite, felizmente já neste novo século conseguimos resgatar o Tejo, voltámos a ter as suas margens libertas, para todos nós o pudermos usufruir...


(Fotografia de Luís Eme - Fonte da Pipa)



quarta-feira, 19 de julho de 2023

"Toda a bacia do rio, feito um mar, se limpou, se alisou, se esmaltou de preciosas cores e nelas corriam as microscópias velas brancas das faluas"


«Recordo a última tarde que fui a Penha de França. Era em Agosto e a atmosfera enovoada, mas de finíssima cinza, não de pérola transluzente, baralhava as linhas da larga paisagem. O rio mal se distinguia da terra pela aglomeração de bagos de arroz, de pedacitos de cal, onde se denunciavam a custo as povoações da beira-de-água. A noroeste ondulavam com branduras de feltro as serranias que rematam em Sintra, a qual, orgulhosa e teimosa, sempre recortava o céu com o seu característico desenho, mais agudamente e miudamente dentado no castelo. Um bafo, leve, de brisa joeirou a cinza ténue do Sol que ao declinar jorrava oiro vermelho pelo boqueirão da barra. Toda a bacia do rio, feito um mar, se limpou, se alisou, se esmaltou de preciosas cores e nelas corriam as microscópias velas brancas das faluas, tão numerosas, tantas, perseguindo-se, cruzando-se, roçando-se, quase sopradas e caídas aos molhos.»

[M. Teixeira Gomes, in "Agosto Azul"]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa com outras "faluas"...)


terça-feira, 11 de julho de 2023

"Tornaremos a atravessar o rio"...


«Tornaremos a atravessar o rio, que grande mar, e um senhor que vai no barco diz com muito bom modo, isto aqui é o Tejo, o mar é além, e apontou, e então é que reparámos, não se via terra, será possível. Quando desembarcarmos no Montijo ainda andaremos quantos quilómetros, oito, até ao aposento do nosso trabalho, gastou-se tanto dinheiro, mas valeu a pena, e quando voltarmos a Monte Lavre vamos ter muito que contar, para que não se diga que a vida não tem também coisas boas.»

[extraído de um dos capítulos do romance "Levantado do Chão" do nosso Nobel, José Saramago]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


segunda-feira, 10 de julho de 2023

"Rio Tejo" (felizmente voltou a ser nosso...)


«Mesmo que o Mercado da Primavera não tivesse outro interesse, tinha, sem dúvida, um e importante, o de nos proporcionar durante o tempo da visita, uma nesga do rio Tejo, e de podermos comer ou tomar um café, ali, com o rio por assim dizer aos nossos pés.

Este Tejo é, de facto, um rio abandonado pelos deuses dos rios. Está quase todo tapado, vedado, escondido, armazenado, por assim dizer, lá para o fundo da cidade. Fábricas, estaleiros, sei lá, tudo serve para que o não veja o lisboeta nem mesmo o turista - é bom não esquecer o turista, o sol e o céu azul não bastam para o atrair, é bom ajudar um pouco. E o Tejo... para o observarmos de perto temos de ir por aí fora para as bandas de Vila Franca, ou então desembocar da auto-estrada em Caxias, onde ele ainda não é mar mas também já não é rio.»

[parte inicial de uma das memoráveis crónicas de Maria Judite de Carvalho, imortalizadas no livro, "Este Tempo", datada de Junho de 1971]

Nota: Felizmente já neste novo século conseguimos resgatar o Tejo, voltámos a ter as suas margens libertas, para todos nós o pudermos usufruir...


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, 29 de junho de 2023

Quando o vento sopra e acorda os sentidos...

 


Tudo começou de manhã, cedo. 

Acordei com o seu sopro forte, que poderia muito bem ser um rugido. O Vento era mais uma vez, o porta-voz da natureza, e dizia que podia quase muito.

E durante o dia fez-nos o favor de ir varrendo a tal nuvem gigante que chegou do Canadá, cujos vestígios dos incêndios pintaram o céu de um amarelo quase acinzentado. Durante a tarde olhei para o espaço e da janela do lado sul já se via o azul, ao contrário da janela norte (curiosamente, virada para o rio).

O melhor estava reservado para a noite. A Lua voltou, tal como as Estrelas, que são possíveis de avistar da minha janela com toda a nitidez, graças à largueza Tejo.

Até apetece dizer que o melhor "Rio do Mundo" faz com que quase tudo seja possível ao olhar...

[texto de Luís Milheiro, publicado no "Largo da Memória]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


domingo, 21 de maio de 2023

"Ribatejo e Alentejo"

 
Ribatejo e Alentejo

Ó águas do rio Tejo
De tão longe caminhando,
Entrea riba e o além,
Sempre, sempre deslizando.

Pelos campos, onde passam,
Às suas terras vão dar;
Alimento tão vital. 
Para as plantas medrar.

Suas águas espalhando,
As terras enriquecendo, 
Rio Tejo vai cheio,

Apressado vai descendo.

Apressado vai descendo,
Para no mar se deitar,
Rio Tejo vai com pressa,
Pressa de chegar ao mar.

[Manuel da Várzea, in "Pelos Caminhos da Poesia"]


(Fotografia de Luís Eme - Vila Velha de Rodão)


sexta-feira, 19 de maio de 2023

"A Ilusão do Mar da Palha"



"A Ilusão do Mar da Palha"

Não sei porque lhe chamam Mar da Palha.
Também não me importa muito saber.
Sei que é mesmo um Mar, e que me já deixou perdida.
Sim, antes de conhecer bem as duas margens do Tejo, não sabia lá muito bem para que lado ficava o Mar.
Podia ficar na direcção de Belém, mas também podia ficar depois de Alcochete.
Gosto desta "ilusão" que nos é oferecida pelo Mar da Palha, que também deve baralhar muitos turistas, que gostam de perder o Norte e o Sul das coisas, como eu...

(Texto da Bela)


(Fotografia de Luís Eme - Almada)


domingo, 30 de abril de 2023

"Abril, Cacilhas e Tejo"

 


Abril, Cacilhas e Tejo

Abril vai embora,
mais mansinho,
cada vez mais mansinho.

Talvez seja verdade, 
e já não exista tempo 
para revolucionários e revoluções...

O Sol enche tudo
até as esplanadas de gente
que fala inglês com e sem sotaque.

O Tejo está cada vez mais salgado,
nesta outra Cacilhas que pisca o olho 
a quem atravessa o rio de Cacilheiro.

O Tejo está cada vez mais azul
nesta outra Cacilhas que faz vénias
a quem vem gastar dinheiro.

Zé Gê Éfe


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, 20 de abril de 2023

"Era uma Delícia a Travessia do Tejo entre Margens"


[...] «No Verão, era uma delícia a travessia do Tejo entre margens. Cardumes de peixes eram visíveis e bandos de roazes nas suas cabriolices acompanhavam os barcos. Os passageiros já estavam tão habituados que não lhes ligavam. Alguns patuscos decalçavam-se e lá vinham com os pés dentro de água...

Era frequente, roazes e golfinhos subirem o Tejo junto à margem sul à caça de chocos e lulas que na época própria entravam no estuário à procura dos sapais do Seixal, Moita e Montijo para desovarem. Eram dias de festa para os cetáceos e pescadores de Cacilhas.» [...]


[Diamantino Lourenço, in "Cacilhas, ponto de  partidas, local de passagem"]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


sexta-feira, 31 de março de 2023

"Roteiro de Lisboa"


Roteiro de Lisboa

Vejam meus senhores
é uma cidade
com suas crianças
homens sem idade

É uma cidade
cercada colhida
é uma cidade
uma rapariga

Casas de ocultar
os homens lá dentro
mulheres que se mostram
envoltas no vento

Vejam meus senhores
é uma cidade
com seus monumentos
histórias de braçado

[...] 

Lá em baixo o Tejo
que é nome do rio
a lamber as armas
com suas colunas 

Com seus prédios velhos
um rio lá em baixo
a lamber as pedras
as pernas-guindastes

De onde o seus bateis
partiam diurnos
vejam meus senhores
é uma cidade
de mãos empurradas
no fundo sem idade
com suas crianças
homens dos olhos

De bruços o céu
com seus girassóis
Lisboa é cidade
com heróis de luto 

Maria Teresa Horta

 

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, 29 de março de 2023

"A Luz de Lisboa"


«Lisboa é uma cidade meridional da Europa, com muitas horas de sol descoberto, o que não acontece em muitas outras, aspecto que se encontra evidenciado na exposição. Por outro lado, encontra-se sobre o rio, que está a sul e corre de Nascente para Poente, funcionando como um enorme espelho de água que reflecte incrivelmente a luz.»

[Ana Eiró, in "A Luz de Lisboa"]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


terça-feira, 21 de março de 2023

A "Visita Guiada" do Romeu...

 

Visita Guiada
  
a visita começou em Cacilhas
a bonita terra dos “orelhudos”
e de tantas outras maravilhas
que não davam espaço a sisudos
 
com a tua arte de contador de histórias
falaste do Arrobas, do Elias Garcia
e de tanta gente de felizes memórias
utilizando alguns pós de fantasia
 
depois vieram os lugares mágicos
que não trouxeram apenas encanto

focaste os acontecimentos trágicos
salvos por um ou outro “santo”
 
quando abriste a porta dos restaurantes
sentimos o aroma das belas caldeiradas
convocaste mais personagens apaixonantes
que na tua voz se tornaram encantadas
 
depois caminhámos em direcção ao “Rio-Mar”
era ali que começava e acabava o Ginjal
com tantas aventuras para contar
e quase sem darmos por isso, estávamos no Ponto Final


(Luís [Alves] Milheiro)


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

"A Avenida da Margem Sul e os Transportes do Tejo" (três)


Vamos transcrever mais uma eloquente passagem da conferência de Agro Ferreira, que se realizou em Almada no já longínquo ano de 1933...

[...] «O Tejo contém em si toda a história da nacionalidade, desde a tomada de Lisboa aos mouros, até às descobertas; desde a nossa epopeia de conquistas pelo mundo além, até ao momento colonizador e até ao momento internacional presente.

O Tejo tem sido e será sempre a lombada do livro onde Camões escreveu o título da sua obra. Lombada, dum livro, digamos, cujas páginas se tem aberto só para um dos lados; lombado dum livro que os lisboetas não tem querido ler, reler, decorar, estimar e admirar largamente como merece, abrindo as suas folhas para um e outro lado, para uma e outra margem do rio.

Fugir do Tejo é fugir à contemplação, ao reviver de toda a história de Portugal, é fugir ao seu passado e ao seu presente; é tentar o retardamento do seu futuro.» [...]

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

"A Avenida da Margem Sul e os Transportes no Tejo" (dois)


Continuamos com a conferência de Agro Ferreira, de 1933...

[...] «Vemos frequentemente discutidos o porto de Lisboa, os cais, a margem citadina pejada de depósitos de toda a natureza, oferecendo por vezes o espectáculo de estendal de sucatas.

O Porto de Lisboa... Meio porto, afinal lhe chamo eu, pois só se tem contado com a margem norte do Tejo, esquecendo que existe a margem sul, e que, enquanto a entrada do Tejo oferecer estes espectáculo de abandono, o porto de Lisboa dará sempre a impressão de pequenez miserável, resultante do desaproveitamento do natural conjunto das suas margens.» [...]

Nota: Infelizmente tivemos de esperar pelo século XXI para que as margens do rio fossem aproveitadas e devolvidas aos lisboetas e visitantes...

(Fotografia de Luís Eme - Porto Brandão)


sábado, 25 de fevereiro de 2023

"A Avenida da Margem Sul e os Transportes no Tejo" (um)


Em 1933, um homem chamado Agro Ferreira, já via muito mais longe que as pessoas que estavam no poder, na relação das duas Margens do Tejo, quer de Almada, quer de Lisboa, com o "Mais Belo Rio do Mundo"...

Vamos transcrever as partes mais importantes da sua conferência "A Avenida da Margem Sul do Tejo e os Transportes do Tejo", proferida em Almada, em Março de 1933, graças ao Boletim "Almada na História" (19-20), por aqui:

«Antes de enfrentar o mar e para chegar naturalmente até ele, Lisboa deveria ter acompanhado o Tejo.

Tudo indicava que assim deveria ter sido; tudo indica que assim deverá, ainda, ser para o futuro.

O Tejo das descobertas, o Tejo porto de mar, o Tejo cais da Europa, o Tejo porto de pesca, o soberbo Tejo panorâmico, rodeado do lado Norte de suaves encostas, até Cascais, indicava na verdade, historicamente, artisticamente, e até higienicamente, a orientação da urbanização citadina.

E assim se teria atingido o mar com as novas avenidas, que lançadas para o interior, ficariam confinadas, sem as prespectivas, que pelas meias encostas, no sentido longitudinal, lhes eram oferecidas, pelo estuário soberbo, ou, já mais adiante, pela baía majestosa, pelo mar, em fim.» [...]

(Fotografia der Luís Eme - Olho de Boi)


terça-feira, 31 de janeiro de 2023

"Seu Apelido - Lisboa"


Seu apelido – Lisboa
 
 
É varina, usa chinela,
tem movimentos de gata.
Na canastra, a caravela;
no coração, a fragata
 
Em vez de corvos, no xaile
gaivotas vêm pousar.
Quando o vento a leva ao baile
Baila no baile co’ o mar.
 
É de conchas o vestido;
tem algas na cabeleira;
e nas veias o latido
do motor de uma traineira.
E nas veias o latido
Do motor duma traineira
E nas veias o latido
Do motor duma traineira
 
Vende sonho e maresia,
tempestades apregoa.
Seu nome próprio, Maria.
Seu apelido, Lisboa
Seu nome próprio - Maria
 
 
David Mourão-Ferreira


(Fotografia Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

"Almada Terra Coragem"



 Almada Terra Coragem
 
Vive em frente de Lisboa
Sobre o Tejo Debruçada
Terra de gente de proa
Linda Cidade de Almada
 
Há quem lhe chame Outra Banda
Por morar do lado esquerdo
Ser sentinela e varanda
De um povo que não tem medo
 
Foi terra valente
Por nós sempre amada
Foi grito, semente 
De gente acordada
 
Almada fabril
De ganga vestida
Almada de Abril
Nunca foi vencida
 
No tempo da tirania
A velha Vila de Almada
Lutou p'la democracia
Foi bandeira e foi vanguarda
 
Por isso a ti, ó Cidade
Quero prestar-te homenagem
Raiz, Força, Liberdade
Almada, Terra Coragem

 
[Poema de Orlando Laranjeiro, do livro que tem como título este poema, "Almada Terra Coragem"]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)