sábado, 30 de novembro de 2019

"Outra Vez o Tejo"


O poeta Eugénio de Andrade também se encantou com o Tejo...

Outra Vez o Tejo
  
Um barco atravessa o Tejo.
Vem da infância, não sei para onde vai.
É branco, dessa brancura só dada
às aves. O rio,
que não via há tanto tempo,
entra agora pelas ruas de Lisboa
ao encontro da tão amada
luz dos jacarandás.
Volto a ter oito anos neste jardim,
vou perder-me nestas ruas,
nestas calçadas, onde o grito
das gaivotas sobe a prumo,
vou correr com o vento de esquina
em esquina, subir
com as árvores, ser
com elas poeira fina.

[Eugénio de Andrade]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)

terça-feira, 26 de novembro de 2019

“Isto é Constantinopla. Não há nada mais parecido”


Tenho deixado um pouco ao abandono este "Olha o Tejo". Mas hoje, durante o meu trabalho de pesquisa, "tropecei" numa frase que diz muito de Lisboa, de José Sarmento de Matos, historiador de Arte (entrevista à revista "E", de 6 de Maio de 2017).

«O ar, a cor, a luz... A maneira como a cidade se foi adaptando à orografia, tornando-se barroca no sentido das perspetivas inesperadas. Vai-se na Rua da Escola Politécnica, olha-se para a esquerda e tem-se o Tejo lá em baixo. É também barroca no sentido da surpresa, é feita de pequenos recantos onde tudo se encaixa. Isto é das coisas que mais me encanta. E a luz, claro, que tem a ver com a sorte de apanhar o vento norte que limpa tudo e fica só a reflexão da bacia do mar da Palha. Neste aspecto, Lisboa tem uma condição única. Tem o mar à frente. Só é comparável a Istambul. O Calouste Gulbenkian saía do Hotel Avis, ia para o alto de Monsanto, sentava-se numa cadeirinha, ficava ali a olhar para o Tejo e dizia: “Isto é Constantinopla. Não há nada mais parecido”.»
                                              
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)

quarta-feira, 6 de novembro de 2019

A Sophia e o "Nocturno da Graça"...


Hoje é dia da Sophia e por isso deixo aqui partes do seu poema "Nocturno da Graça"...

Há um rumor de bosque no pequeno jardim
Um rumor de bosque no canto dos cedros
Sob o íman azul da lua cheia
O rio cheio de escamas brilhas.
Negra cheia de luzes brilha a cidade alheia.
[...]

Com os seus bairros de becos e de escadas
De candeeiros tristes e nostálgicas
Mulheres lavando a loiça em frente das janelas
Ruas densas de gritos abafados
Castanholas de passos pelas esquinas
Viragens chiadas dos carros
Vultos atrás das cortinas
Cíclopes alucinados.
[...]

Sozinha estou contra a cidade alheia
Comigo
Sobre o cais sobre o bordel e sobre a rua
Límpido e aceso
O silêncio dos astros continua.


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)