sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

"O Meu Postal"


O meu Postal

Escrevi-te um postal
falei da tua outra Cidade
do Tejo que alinda o teu Ginjal,
que parece não ter idade.
Não esqueci as cores,
os cheiros e as gentes
reféns de histórias de amores
um tudo nada diferentes.

Escrevi-te um postal
chamei-te amigo inteiro
sem esquecer o teu sabor a sal
e teu ar sorridente de marinheiro.

Não esqueci o vento
do final da nossa tarde.

Guardo-te no meu pensamento
e no meu coração, que arde...

Laura Martinho

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)



terça-feira, 30 de novembro de 2021

("Afinal")


21.

A palavra «Tágide» vem de um tempo antigo (pastoras, flautas, canções, águas sossegadas) sem esquecer que os bons dicionários  a referem como  «Ninfa do Tejo».
Hoje ainda há «Tágides» na febre da cidade, na pressa para coisa nenhuma, no ruído que esconde as palavras.
Afinal, esse tempo antigo permanece na força de um olhar que separa a terra da água.

[José do Carmo Francisco, in "Afinal"]

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


domingo, 21 de novembro de 2021

"Voltar à Infância"


«Quando apanhou o cacilheiro no Cais Sodré e se viu no meio do rio, recordou-se da meninice passada rente ao Tejo, nas brincadeiras diárias que fazia ao longo do Ginjal com os amigos, por entre os operários das várias indústrias que davam vida aquele lugar tão aprazível.

Vieram-lhe à memória dois ou três rostos de amigos mais chegados. O que seria deles, vinte e muitos anos depois? Talvez não os reconhecesse às primeiras, sabia o quanto a vida gostava de nos mudar por dentro e por fora...

Deixou as pessoas irem saindo, enquanto olhava pela janela do cacilheiro o que podia ver de Cacilhas e do Ginjal. Depois desceu as escadas e saiu calmamente para terra. Primeiro espreitou o Ginjal. Estranhou ser recebido por placas informativas colocadas pelo Município, que eram no mínimo alarmantes, pois identificavam várias casas e armazéns em perigo de ruir. Ficou com uma vontade enorme de seguir por aquele caminho quase proibido, mas ao olhar o relógio, achou que era melhor ideia este passeio ficar para depois do almoço.

Percorreu com alguma emoção o Largo de Cacilhas e depois entrou na Rua Cândido dos Reis. Olhou para os vários restaurantes, ainda sem se decidir onde iria comer uma caldeirada de peixe. Tinha prometido a si mesmo só parar rente ao número 27.» 

(começo de um texto inédito escrito no final do século XX)

[Luís (Alves) Milheiro]

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, 21 de outubro de 2021

"As Portas de Rodão"

«Durante milhões de anos, o Tejo foi “a mão construtora desta paisagem”, definia momentos antes Filipa Almeida, arquitecta paisagista e apicultora, uma das nossas principais cicerones nesta viagem pelas terras da Beira Baixa. A cordilheira onde nos situamos foi formada há cerca de 600 milhões de anos, rompendo o horizonte numa crista quartzítica crispada. Durante anos e anos, as águas do Tejo foram pacientemente escavando a base da serra das Talhadas, feita de xisto, uma pedra menos dura que o quartzo, no topo. A erosão provocada pela acção do rio acabaria por rasgar uma cascata e, mais tarde, abrir uma passagem que se foi, entretanto, alargando: as Portas de Ródão, classificadas como monumento natural desde 2009.»

[Mara Gonçalves, "Fugas (Público)", 15 Nov 19]


(Fotografia de Luís Eme - Vila Velha de Rodão)


segunda-feira, 4 de outubro de 2021

"Restelo"



Restelo

Sentado à beira-Tejo, à porta de Lisboa,
eu penso em quantas naus outrora havidas
não estiveram presentes nas chegadas,
na glória de contar as glórias idas, 
tendo estado nas fainas perfiladas
para o clamor e o assombro das partidas.



[João Rui de Sousa in "Lisboa com Seus Poetas", antologia de poesia sobre Lisboa, organizada por Adosinha Providência Torgal e Clotilde Correia Botelho]


(Fotografia de Luís Eme - Belém)


quarta-feira, 22 de setembro de 2021

"Outra Canção Gratuita"

 


Outra Canção Gratuita

Café glacé... Vida boa...
Tempo plano, claro, quieto...
Rodar suave do eléctrico...
Última tarde em Lisboa...

Há um quadrante doirado,
Rosa-chá por desfolhar,
Naquela casa de esquina
Com alecrim no telhado...

Café glacé... Vida amiga...
âncora na água do rio...
grão de areia, remo esguio...
Minha infância reavida...

Tão sossegada à janela
Prostitutinha de branco...
E a brisa fresca do Tejo
Não desfaz a aguarela...

[Cristovam Pavia, in "Lisboa com Seus Poetas", antologia de poesia sobre Lisboa, organizada por Adosinha Providência Torgal e Clotilde Correia Botelho]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


sexta-feira, 10 de setembro de 2021

"Miradouro"

 


Miradouro

Frágeis, acenam alvos lenços d'asas
as gaivotas que a brisa mansa, embala.
O rio azula, emoldurado em casas.
- Que lindo quadro para pôr na sala!

No lírico perfil fogem veleiros,
onde embarquei uns restos de ansiedade;
e no cais, os guindastes e os cargueiros
são prática e viril realidade.

É mentira, talvez,
assinar com o meu nome esta poesia; 
o Tejo foi quem na fez...
Cheira a limos, a sal, a maresia.

António Manuel Couto Viana

["Lisboa com os seus Poetas - Colectânea de Poesia sobre Lisboa"]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


terça-feira, 7 de setembro de 2021

"Lisboa"...


Lisboa

Esta névoa sobre a cidade, o rio,
as gaivotas doutros dias, barcos, gente
apressada ou com o tempo todo para perder,
esta névoa onde começa a luz de Lisboa, 
rosa e limão sobre o Tejo, esta luz de água, 
nada mais quero de degrau em degrau.

Eugénio de Andrade

["Lisboa com os seus Poetas - Colectânea de Poesia sobre Lisboa"]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, 25 de agosto de 2021

"Anos Quarenta, os Meus"


Anos Quarenta, os Meus

De eléctrico andava a correr meio mundo
subia a colina ao castelo-fantasma
onde um pavão alto me aflorava muito
em sonhos à noite. E sofria de asma

alma e ar reféns dentro do pulmão
( como um chimpanzé que à boca da jaula
respirava ainda pela estendida mão ).
Salazar três vezes, no eco da aula.

As verdiças tranças prontas a espigar
escondiam na auréola os mais duros ganchos.
E o meu coito quando jogava a apanhar
era nesse tronco do jardim dos anjos

que hoje inda esbraceja numa árvore passiva.
Níqueis e organdis, espelhos e torpedos
acabou a guerra meu pai grita "Viva".
Deflagram no rio golfinhos brinquedos.

Já bate no cais das colunas uma
onda ultramarina onde singra um barco
pra Cacilhas e, no céu que ressuma
névoas águas mil, um fictício arco-
-irís como é, no seu cor-a-cor,
uma dor que ao pé doutra se indefine.
No cinema lis luz o projector
e o FIM através do tempo retine.

  

[Luiza Neto Jorge, in Revista Colóquio/Letras, n.º 97, Maio 1987]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)



quarta-feira, 21 de julho de 2021

"Quintal do Meu Olhar"

 


Quintal do Meu Olhar

Meu humilde rio, meu companheiro, quantas vezes te tenho
sido ingrata
                 e pensado; que pena não seres o mar
o alto mar selvagem!
                Confesso que lhe apeteço
o sem limite
                sem casas sem casos sem coisas
sem nada
                Mas tu és o amplo quintal do meu olhar
quotidiano
                onde crio minhas soltas gaivotas com o milho
dos meus versos
                A líquida selva do mar não consente 
as diárias labutas os pequenos júbilos do pobre bicho
que somos
            Desculpa a ingratidão de às vezes te desejar maior 
mais possante mais sozinho
            És tão meu amigo!
            No ir e vir dos pequenos barcos afadigados
me dás constantemente de vaia
            e ofereces-me as brancas 
flores de espuma em que te desentranhas enquanto
te vão sulcando
            As tuas gruas e os teus guindastes sempre em sereno
movimento dão-me exemplos de apego 
à vida
            Anima-te!
            Gritas à minha tristeza
sem interromper a tua lida
            de fato de ganga e flor na orelha 
sempre jovem
            Não mudaste desde que te conheço
Que fazes para não envelhecer?
            Talvez um dia destes quando a Lisnave
desaparecer
            e desaparecerem os barcos as gruas os guindastes
eu perceba com o coração desfeito, que és mortal

[Teresa Rita Lopes, in "Afectos"]


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)

quinta-feira, 15 de julho de 2021

"Espreitar o Rio das Colinas"


 

Espreitar o Rio das Colinas
 
Lisboa é um encanto.
Quem disser o contrário é mentiroso.
Há algo mais bonito que o Tejo
e os seus bairros erguidos
 nas colinas da cidade?
 
Adoro espreitar o rio,
de qualquer uma das suas colinas,
de qualquer um dos seus miradouros.
Amo Lisboa!
 
Zé Gê Éfe

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


segunda-feira, 5 de julho de 2021

"Do Alto da Memória"



 Era Velhinha

Conheci Almada velhinha
Bem na minha mocidade
Quando se moia farinha
Na Cova da Piedade

Almada e as suas gentes
Todos tinham um desejo
Formarem fortes correntes
Bem amarradas ao Tejo

Lamento ter desaparecido
Uma das suas maravilhas
Mas já foi devolvido
O grande Farol de Cacilhas

Naqueles dias sem Sol
Com intenso nevoeiro
Era o sinal do Farol
que atracava o cacilheiro.

Manuel dos Anjos Delgado


Homenagem a um amigo que nos deixou ontem e gostava muito de escrever poesia. Este poema faz parte do seu terceiro livro, "Do Alto da Memória".


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quarta-feira, 30 de junho de 2021

Romeu e as suas Memórias do Cais do Ginjal


«Passei os primeiros vinte anos da minha vida no Cais do Ginjal, aprendi desde muito cedo a nadar no Tejo, que ainda estava habitado por muitos peixes... e havia o folclore único dos golfinhos. Estou a falar de uma época em que tanto no cais como no rio havia muita vida, uma vez que o Ginjal estava cheio de fábricas e armazéns, donde se destacavam as tanoarias e as fábricas de conserva de peixe.»

[In "Gente D'Almada", Romeu Correia o Escritor e o Desportista", entrevista de Luís Alves Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


domingo, 20 de junho de 2021

"Ó Minha Cidade Bela"


Porque hoje se comemora o centenário no nascimento da escritora, Matilde Rosa Araújo, publico aqui com a devida vénia, o seu bonito poema, "Ó Minha Cidade Bela", do seu livro, "O Cantar de Tila":


Ó minha cidade bela

 Ó minha cidade bela,
Feita de rio e de mar:
Meu coração é um navio,
P'las ruas a navegar.

Ó minha cidade bela,
Feita de mar e de rio:
Teus passeios são as ondas
Eu lá vou com meu navio!

Já sou uma senhorinha
Tenho sapatos de salto:
Ó minha cidade bela,
Já navego no mar alto!

Já navego no mar alto!
Sem ninguém à minha beira:
As cores do meu navio
São flores de laranjeira!

Ó minha cidade bela,
Feita de rio e de mar:
É tão branco o meu navio
Não o deixes naufragar!


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quarta-feira, 26 de maio de 2021

"Sonhos Cor de Água"


Ainda com o Tejo, com o "Casario" e com as minhas palavras...

«[...] Enquanto esperava, calmamente, pelo cacilheiro, ficou com a sensação que aquele largo que, fora nos anos oitenta o maior centro de circulação de pessoas e transportes da Europa, estava cada vez mais calmo. Tudo graças ao comboio da ponte...
Uns metros mais à frente descobriu uma cara conhecida, Pedro Sempre, outro herói das suas crónicas mundanas.
Pedro era um velho contador de histórias que passava parte dos seus dias fundeado num banco de madeira, assistindo ao cair da tarde rente ao seu Tejo.
Quem quisesse ouvir qualquer aventura do mundo só precisava de se sentar e escutar com atenção, a sua voz pausada, o melhor bilhete para uma mão cheia de viagens, extraordinárias, pelo Ocidente e Oriente, que se tentavam aproximar das de Fernão Mendes Pinto.
À medida que falava, o velho fazia festas ao Banzé, o seu companheiro de sempre, um cão escanzelado que lhe aquecia os pés e a alma, escondendo com o seu pelo deslavado, os buracos dos sapatos gastos, com ar de quem já dera mais que uma volta ao mundo [...]»

[Parte do conto "Sonhos Cor de Água", in "Um Café com Sabor Diferente", de Luís Alves Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sábado, 22 de maio de 2021

"Desta Janela"


Ainda com o Tejo dentro do "Casario do Ginjal", mais uma espécie de poema:


Desta Janela
 
Desta Janela
Com Vista Para o Ginjal
Posso ver
a beleza do Tejo
o verde das encostas
e claro
o Casario do Ginjal...
 
Luís (Alves) Milheiro


Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, 13 de maio de 2021

"Dava Grandes Passeios com o Avô..."


Continuando com as primeiras publicações no "Casario do Ginjal", uma transcrição do meu primeiro e único romance, publicado em 1995, com o Tejo e o Ginjal:

« [...] Quis recordar-se da sua primeira visita ao Oceano Atlântico, não conseguiu qualquer imagem. Devia ser demasiado pequeno. Ter vivido sempre paredes-meias com o Tejo não ajudou muito, o rio foi o seu primeiro mar. Dava grandes passeios com o avô pela estrada marginal do Ginjal. O velho Vasco Gama falava-lhe do tempo dos golfinhos e dos homens que nadavam até Lisboa. Os seus olhos brilhavam quase encantados, seguindo o voo das gaivotas e escutando aquelas palavras mágicas, acompanhadas pelo marulho leve das águas que lavavam as paredes da pedra do cais e eram mais que música de fundo [...].»

[In "Bilhete para a Violência", de Luís Alves Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


domingo, 9 de maio de 2021

"Além das Pedras, Temos o Rio" (um começo...)


No final de Maio de 2006 criei o meu primeiro blogue, que ainda continua a resistir ao tempo - o "Casario do Ginjal".

Como escrevi no seu subtítulo: "nasceu como um espaço de opinião, informação e divulgação de tudo aquilo que vivia ou sobrevivia nas proximidades do Ginjal e do Tejo, mas foi alargando os horizontes...

O mais curioso foi eu perceber que ele estava mesmo "cheio de Tejo", nos primeiros textos que publiquei (fui ler e gostei...). É por isso que durante este Maio de 2021, quinze anos depois deste começo, vou republicar essas prosas poéticas e poesias prosaicas. 

Começo com as primeiras palavras:


Além das Pedras, Temos o Rio…
 
 
Além das pedras e do entulho amontuado,
(nesta margem esquerda)
sinais vulgares de abandono,
temos o Rio,
esse mesmo, (único)
o Tejo...
 
é ele que dá vida a este meu casario,
do Ginjal...
 
[Luís (Alves) Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal-Tejo)


sexta-feira, 30 de abril de 2021

"Cravos Caídos"


Cravos Caídos
 
CRAVOS CAÍDOS
na praia que foi de pobres e vagabundos
quase sempre abandonados e esquecidos
em todas as “guerras dos mundos”…
 
CRAVOS CAÍDOS
na praia que foi das lavadeiras
que presas os seus trabalhos doridos
passaram por ali as vidas inteiras.

[Luís (Alves) Milheiro]
 
Este poema e esta fotografia fizeram parte da exposição, "Cravos de Abril, fotografias com palavras", de Abril de 2014, na comemoração dos 40 anos da Revolução de Abril.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)
 
 

sexta-feira, 23 de abril de 2021

O Tejo com Livros


Se há um lugar que nos ajuda a entrar dentro dos livros, é à beira do Tejo, o rio que é da "minha aldeia", e que por isto e por aquilo, "é o melhor rio do mundo"...

Foi o que pensou a "Musa", que entrou dentro da minha fotografia, sem dar por isso. 

O livro e o Tejo eram as coisas "mais importantes do mundo"...


(Fotografia de Luís Eme - Fonte da Pipa)


sábado, 27 de março de 2021

Olá Teatro!

 

Olá Teatro!
Teatro das ruas, das gentes,
dos carros, das bicicletas,
dos espantos, das palavras, 
das buzinas, dos gritos,
dos pombos, das gaivotas...

Olá Teatro!
Teatro do Tejo azul,
das barcas laranjas, dos veleiros,
dos pescadores de maré baixa,
dos sonhadores que mesmo quase perdidos
não abrem mão do silêncio...


[Luís (Alves) Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


terça-feira, 16 de março de 2021

O Cais é um navio comprido



O cais é um navio comprido
sem motores e sem hélices
construído apenas para ficar
e ser, um caminho aberto
para sonhar viagens...

O cais é um navio comprido
com meia-dúzia de bancos de cimento 
espalhados à beira Tejo
que são um convite
para os velhos e novos do restelo...


[Luís (Alves) Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Teu Nome é "Desconhecida"...


Teu nome é "Desconhecida",
o nome que mais existe pelas ruas 
por onde vagueamos...


Estás de costas para o Tejo
e eu roubo-te uma fotografia.
Mas olhaste para mim,
com um sorriso a dizer-me
"estou aqui"!
E sim, sou a tua "Desconhecida".


[Luís (Alves) Milheiro]


(Fotografia de Luís Eme - Boca do Vento)


quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

"A presença liquida do Tejo faz parte da minha vida"


«Abro a janela do meu minúsculo apartamento na Graça, mais ninho de águia ou caixa de fósforos que outra coisa...

A presença liquida do Tejo faz parte da minha vida. É a minha auréola de graça desde a Ponte Vasco da Gama até ao Cristo-Rei que vejo ao lado duma ameia do Castelo de São Jorge...

O Tejo é agora um grande rio caudaloso de vinho que me atormenta...

Então à noite, oiço-o chamar-me...

É uivo de cacilheiro... Mugido de rebocador... Vozeirão de paquete...»


[Manuel da Silva Ramos, "O Sol da Meia Noite"]


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa/ Tejo)


domingo, 31 de janeiro de 2021

O que o Tejo nos Dá...


É normal que em tempos como os que estamos a viver, se procurem mais as margens do Tejo.

As suas águas dão-nos a sensação de liberdade, de paz, que precisamos, nestes tempos de "guerra", cheio de "prisões" voluntárias e involuntárias...

Felizmente na minha margem (Sul), mais cinzenta, fechada e húmida, é possível caminhar, ainda que quase clandestinamente, ao lado do Tejo (também colocaram fitas a fechar alguns caminhos, mas muitas foram cortadas, em nome da "liberdade anarca"...), sem nos cruzarmos com muita gente.

(Fotografia de Luís Eme - Boca do Vento)


segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Lisboa, Tejo e Carlos do Carmo


Carlos do Carmo que nos deixou no dia primeiro deste ano de dois mil e vinte e um, cantou Lisboa e o Tejo como muito poucos, porque sempre foi um apaixonado e um protector da sua (e nossa) Cidade. 

O facto de ter nascido e crescido na Bica, quase com o Tejo no final da rua, fez com que se deliciasse desde muito cedo com as mil e uma tonalidades que o Rio lhe oferecia, espelhando um céu, quase sempre azul...

Depois do casamento foi viver para as Avenidas Novas mas nunca deixou a Velha Lisboa, que amou e cantou com a cumplicidade dos nossos melhores poetas.

Deixamos aqui três testemunhos do seu amor pela Cidade e pelo Rio: 

«Eu tenho um olhar muito romântico sobre a cidade, e os olhares românticos são incuráveis, completamente incurável. E as mazelas e os seus defeitos, não é que os esconda, não lhes dou importância que provoquem infelicidade, sabe? Lisboa tem coisas tão boas, que eu deixo que no campeonato ela fique esses pontos todos à frente das coisas que estão mal feitas.»                              

«Lisboa é uma cidade sui generis. Há que ter apreço pelo trabalho de quem foi pondo a população virada para o rio, porque vivemos anos nesta coisa sombria, de costas para o Tejo. Isto deu luz à cidade. E o português é acolhedor, sem ser servil. Deixe-me circunscrever à minha cidade, sendo eu bairrista. Mas Lisboa tem uma luz imbatível. As pessoas ficam desvairadas. Os miradouros, os bairros antigos que são o pulsar de uma história de quase 900 anos. E tem uma autenticidade…» 

 «Durante muitos anos o Tejo foi-nos vedado. Hoje há casais a passear com as crianças à beira-rio. De cada vez que vou a uma esplanada junto ao Tejo penso que sou um privilegiado por viver numa cidade com este rio e com esta luz.» 

Nota: Frases retiradas de entrevistas publicadas do Diário de Notícias de 9 de Setembro de 2016  Notícias Magazine” de 23 de Julho de 2014 e “Tabú (Sol)” de 4 de Outubro de 2008.


(Fotografia de Luís Eme - Tejo e Lisboa)