«Recordo a última tarde que fui a Penha de França. Era em Agosto e a atmosfera enovoada, mas de finíssima cinza, não de pérola transluzente, baralhava as linhas da larga paisagem. O rio mal se distinguia da terra pela aglomeração de bagos de arroz, de pedacitos de cal, onde se denunciavam a custo as povoações da beira-de-água. A noroeste ondulavam com branduras de feltro as serranias que rematam em Sintra, a qual, orgulhosa e teimosa, sempre recortava o céu com o seu característico desenho, mais agudamente e miudamente dentado no castelo. Um bafo, leve, de brisa joeirou a cinza ténue do Sol que ao declinar jorrava oiro vermelho pelo boqueirão da barra. Toda a bacia do rio, feito um mar, se limpou, se alisou, se esmaltou de preciosas cores e nelas corriam as microscópias velas brancas das faluas, tão numerosas, tantas, perseguindo-se, cruzando-se, roçando-se, quase sopradas e caídas aos molhos.»
[M. Teixeira Gomes, in "Agosto Azul"]
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa com outras "faluas"...)
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