sexta-feira, 9 de maio de 2025

"Mais Perto do Tejo"


 
"Mais Perto do Tejo"

Mais perto do Tejo
há palavras que tocam
o sossego dos lábios
para dizer o sul da mágua
no voo convergente das gaivotas
quando os barcos se abrem
ao argumento ondulado das marés

Graça Pires

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)



sábado, 26 de abril de 2025

Para um Operário da Lisnave


Para um Operário da Lisnave

Sou um operário!
Amarra certa
neste cais de angústia.

Olho o casco azul
de um navio do mundo
sonho por momentos
com viagens que nunca farei.

Sem trabalho
aqui estou frente ao Tejo

Mas permaneço
vigilante.

Maria Rosa Colaço

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, 17 de abril de 2025

(Viva esta espontaneidade tão boa!)



(Viva esta espontaneidade tão boa!)

Sei lá se há estrelas!
Daqui nas as vejo.
Qualquer dia hei-de ir vê-las
no rio Tejo:

Não no céu tão longe e incerto
onde a custo as descobrimos,
mas a brilharem mais perto
nas águas de treva e limos

Só assim desse modo
consigo entendê-las
Caídas no lodo
é que são estrelas.

José Gomes Ferreira

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)

sábado, 5 de abril de 2025

Gaivotas



Gaivotas

Da lama voam
e o Tejo não é
espelho d'asas

entram nas casas
e os gritos magoam

José Correia Tavares


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)



quarta-feira, 26 de março de 2025

Influente

 


Influente

O maior afluente do Tejo
é este mar de povo
que da rua do Ouro
todos os dias se faz
à Outra Banda.

José Correia Tavares


(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, 11 de março de 2025

"Lisboa na vertente luminosa não mudou"

«A mesma luz branca de Lisboa imortalizada pelo realizador suíço Alain Tanner continua a banhar a cidade, reflectida pelo rio e espelhada no seu casario. Se hoje chegasse a Portugal o marinheiro, personagem principal do filme de Tanner, talvez ainda fosse vítima de roubo e agressão e com um pouco de sorte encontraria Rita a criada de quarto com um diamante negro entre as pernas e viveria as mais belas cenas eróticas da sua paragem na cidade branca.

Lisboa na vertente luminosa não mudou. Mas alterou e muito a sua componente sociológica e tornou-se uma cidade mais caótica e desregulada que a Lisboa de Tanner dos anos 80 do século passado.

Quem vive em Lisboa, ou quem a visita e a percorre de carro ou a atravessa a pé, nota as diferenças com bastante facilidade. Entram, diariamente, cerca de 400 mil carros que se juntam aos 200 mil que existem na capital.»

 

                                                           [António Capinha, “D. Notícias”, 07 Mar 25]


(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Ginjal (início)


 Ginjal (inicio)

Foi há muito tempo...
quase quatro décadas,
que descobri a estrada à beira rio,
conhecida como o "Cais do Ginjal".
Ainda havia operários nas primeiras casas,
alguns habitantes no seu coração
e dois restaurantes no fim...

Era uma forma feliz de caminhar
e falar com o Tejo...

[Luís (Alves) Milheiro]

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

"Sempre o Tempo"


Sempre o Tempo

O Tejo continua igual.
Nós é que estamos diferentes.
Não me vou desculpar com o tempo,
mesmo que ele, simpático,
deixe que o usem para tudo.

Talvez hoje seja mais fotografado.
É estranho, pode ser mais guardado
mas é olhado com menos intensidade, 
por menos tempo e com menos contemplação.

Pois é,
lá volta ele,
sempre o tempo...

[Luís (Alves) Milheiro]

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

O Rio encantador e matreiro...


«Rio Tejo. A calma que transparece o fascínio dos seus contornos, margens e adornos são um verdadeiro encanto. Uma espécie de hipnotismo que não tem outra função senão a de esconder um ser matreiro, ardiloso, traiçoeiro e implacável, capaz de transformar num inferno a vida de quem tem o azar de nele se perder. É esta a face do rio que nos mostra o realizador José Nascimento em Tarde Demais, com estreia agendada para a próxima sexta-feira, 31.»

[José Paulo Vieira, "Visão (sete)", 30 Mar 99]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)



segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

"Decisão"



 "Decisão"

Depois de amanhã
Irei com o Álvaro de Campos para Glasgow.
[...]
O Álvaro de Campos gosta muito de gente
Que está fora do centro de gravidade.

Diz ele que isto de entrar a horas no emprego,
De um tipo pôr gravata e ter de pedir licença ao porteiro,
De tirar atestados de bom comportamento
Diz ele que tudo isto é muito chato muito estúpido.

E tem razão. Gosto de tipos assim.
Que são do avesso.
Que dormem de dia e têm a noite para viver.

São formidáveis!
Conhecem o que vós jamais conhecereis,
Burocratas estúpidos, carneiros de gravata,
Vós que não enetendeus, por que é que o Álvaro
Quer que o Tejo corra ao contrário.

É por isso que eu vou com o Álvaro Campos para Glasgow.
[...]

José Terra 

(Fotografia de Luís Eme - Fonte da Pipa)

domingo, 22 de dezembro de 2024

Os olhos de Cristina

 


Os olhos de Cristina

Inquietos, sacudidos pelo bulício da cidade antiga, os olhos de Cristina vieram da cidade nova e são dois faróis a avisarem a navegação das próximas tempestades quotidianas. Cristina saiu da estação do Metro da Baixa-Chiado e atravessou a muralha mandada construir por D. Fernando para beber um café e comer um bolo. Vista ao longe, diluída na pressa dos semáforos, Cristina não é apenas uma mulher. É também a imagem de uma cidade. Cidade habitada por afectos, cruzada por ruas de sonhos, por praças projectadas na vontade de ser feliz. Se Lisboa é uma cidade-mulher, luminosa e pronta a ser conquistada todas as manhãs, Cristina é uma mulher-cidade e os seus olhos, ora inquietos ora serenos, são as portas dessa cidade luminosa mas apenas existente nas metáforas e nas imagens. À direita, o Rio Tejo dá nos olhos de Cristina a ilusão de estar colocado nos últimos telhados da Rua do Alecrim. («Alecrim, alecrim aos molhos, por causa de ti choram os meus olhos» – diz a cantiga popular. Adiante.) Os cacilheiros, repletos de pessoas e de viaturas parecem desaguar num cais insólito feito de telhas antigas e de gaivotas ruidosas. Para o fim da tarde, no regresso a casa na cidade nova, os olhos de Cristina estão serenos pelo cansaço e pela presença luminosa de Raquel, sua filha. Se de manhã se juntou a cidade-mulher (Lisboa) à mulher-cidade (Cristina) então de tarde vemos que a mistura feliz é da mulher-menina (Cristina) com a menina-mulher (Raquel). Os olhos de Cristina, motivo do texto, são uma espécie de selo branco que vai certificar o momento feliz de encontro e de plenitude que esta crónica procura representar. Ou seja: dar um testemunho feito de palavras resgatadas à pressa da cidade. 

José do Carmo Francisco


(Fotografia de Luis Eme - Lisboa)


segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

Cais do Gás

 

Cais do Gás

Sobe do Mar da Palha um som distante.
Talvez um barco que de longe, espera um rebocador na barra.

Sobe até aos meus ouvidos o ruído da água na pedra.
Repetição do movimento inicial do degelo
quando todos os rios começaram no leito da ternura.

É este o cais das grandes despedidas sempre adiadas.
Por aqui passou há muitos anos o receio
do aviso da mobilização

Mobilizado estava mas só para as pequenas guerras diárias
do sofrimento interior - resmungou a meia voz.
Ainda hoje não sabe se deve dizer barco ou navio.

[José do Carmo Francisco, in "De Súbito"]


(Fotografia de Luís Eme - Tejo)